Por Adilson Motta, 08/2007
Percebe-se a inerência entre linguagem e sociedade de modo
inquestionável. A história da humanidade é a história de seres
organizados em sociedades e detentores de um sistema de comunicação
oral, ou seja, de uma língua. A sociolinguística, que se ocupa
especificamente das relações entre linguagem e sociedade, define como
inquestionável esse binômio sociedade/língua. Acenando com esta mesma
definição, Saussure (apud Tânia Maria Alkmin em Mussalim et al.2001,
p.23), menciona: "A língua é um fato social, no sentido de que é um
sistema convencional adquirido pelos indivíduos no convívio social".
A língua é um fato social e é um processo. Para Benveniste (apud TÂNIA
Maria Alkmim em Mussalim et al. 2001, p.26), "é de dentro da e pela
língua que indivíduo e sociedade se determinam mutuamente." E que, é
pela utilização da língua que o homem constrói sua relação com a
natureza e os outros homens. Prosseguindo, o mesmo autor afirma que "A
linguagem sempre se realiza dentro de uma língua, de uma estrutura
linguística definida e particular, inseparável de uma sociedade definida
e particular".(Idem, p.31). Para Paulo Freire, linguagem e realidade
se prendem dinamicamente.
Segundo Orlandi (1996, p.13),
"A língua, a Ciência e a Política estabelecem entre si relações
profundas e definidoras na constituição do sujeito e da sociedade". E é
na mesma linha de observação que os (PCNs,1999, p. 140) afirmam que,
com, pela e na linguagem as sociedades se constroem e se destroem. Já
para Baktin (apud Maria de Fátima Sopa Rocha et al) afirma que, a
linguagem implica um contexto histórico-social: o homem se transforma
num ser histórico e social, segundo ele, a partir dos signos que lhe
comunicam o mundo na relação, interação e espaço onde este atua como ser
social. E estes signos são sempre impregnados de ideologia, uma vez
que esta reflete e determina as estruturas sociais.
Entre a sociedade e a língua, de fato, não há uma relação de mera
casualidade. Desde que nascemos, um mundo de signos linguísticos nos
cerca e suas inúmeras possibilidades comunicativas começam a tornar-se
reais a partir do momento em que, pela imitação e associação, começamos a
formular nossas mensagens. E toda nossa vida em sociedade supõe um
problema de intercâmbio e comunicação que se realiza fundamentalmente
pela língua, meio mais comum de que dispomos para tal.
A realidade da consciência é a linguagem e, são os fatores sociais que
determinam o conteúdo da consciência, do conjunto dos discursos, que
atravessam o indivíduo ao longo de sua vida, e que se forma a
consciência. Campbell (1996) afirma que os "Mitos são pistas para as
potencialidades espirituais da vida humana". O mundo que se revela ao
ser humano se dá pelos discursos que ele assimila, formando seu
repertório de vida. (...) sob a forma de signos é que a atividade
mental é expressa e internamente para o próprio indivíduo. Sem os
signos a atividade interior não existe. A palavra não é só meio de
comunicação, mas também conteúdo da própria atividade psíquica. Tudo
está em constante comunicação.
Nas grandes
civilizações, a língua é o suporte de uma dinâmica social, que
compreende não só as realizações diárias entre os membros da comunidade,
como também uma atividade intelectual, que vai desde fluxo informativo
dos meios de comunicação de massa até a vida cultural, científica ou
literária. (PRETI, 1974, p.7). Desta forma, é cada vez maior o uso dos
meios de comunicação com objetivos educacionais e de integração do
cidadão à sociedade. Embora possua o direito de votar, o analfabeto
sente dificuldade de integração e de exercer plenamente seus direitos de
cidadão, em face de não saber ler nem escrever. Como a escrita é um
dos meios de se comunicar mais populares na era moderna, a falta dela
faz com que o processo de comunicação do analfabeto, por exemplo, seja
prejudicado.
Valorizando a comunicação nas relações sociais, o
velho guerreiro (Chacrinha)já dizia: "Quem não se comunica se
trumbica!". Pois a linguagem é um instrumento de comunicação cujo
objetivo, além de informar, é persuadir e convencer através das
palavras que nascem e ganham sentido no interior de determinados
contextos: "a linguagem, como se sabe, é sempre, em maior ou menor grau,
uma forma de persuasão, de levar o outro a aderir a um ponto de vista".
(Brait, 1994/1995: 20).
Os membros de uma nação
interligados por traços socioeconômicos e políticos identificam-se e
distinguem-se dos membros de outra pelo instrumento de comunicação, a
linguagem.
Estigmatização linguística e mobilidade
social se intercruzam. A razão disso é que é muito comum num mero
complexo sócio economicamente estratificado, a imposição de norma
linguística do grupo dominante, dos setores mais favorecidos e
produtivos da sociedade como forma correta ou de prestígio. Nesse
sentido é que as estruturas de maiores valores de mercado adquirem
prestígio pelo sistema de valores sociais e estéticos adotados, e
rejeitam as variantes objetivas.
Há, no entanto, uma
dimensão privativa da língua, que a coloca num plano especial: seu poder
coercitivo, que transforma um agregado de indivíduos em uma comunidade,
criando a possibilidade da produção e da subsistência coletiva.
Para Benveniste, a questão da relação entre língua e sociedade se
resolve pela consideração de língua como instrumento de análise da
sociedade. Ele afirma que a língua contém a sociedade e por isto é o seu
interpretante. Esse papel de interpretante é garantido pelo fato de que
a língua é "o instrumento de comunicação que é e deve ser comum a todos
os membros da sociedade". Mais exatamente: "a língua é necessariamente o
instrumento próprio para descrever, para conceitualizar, para
interpretar tanto a natureza quanto à experiência" e as relações sociais
que perpassam pela linguagem. (BENVENISTE, 1974, p. 99). Além disso, a
língua dá forma à sociedade ao exibir o semantismo social, que consiste,
principalmente, de designações, de fatos do vocabulário.
Particularmente, o vocabulário se apresenta como uma fonte importante
para os estudiosos da sociedade e da cultura, pois retém informações
sobre as formas e as fases da organização social, sobre os regimes
políticos etc. Essa linha de reflexão é exemplarmente representada na
obra de Benveniste, Vocabulário das instituições Indo-européias
(1969/1970).
Segundo o referido autor, a língua permite
que o homem se situe na natureza e na sociedade; o homem "se situa
necessariamente em uma classe, seja uma classe de autoridade ou classe
de produção".(BENVENISTE, 1974, p. 101.).
Benveniste
articula a questão da relação língua e sociedade no plano geral da
construção do humano e, particularmente, no plano das relações concretas
e contingentes estabelecidas na vida social. Para Bagno (2003, p.17), a
linguagem apresenta-se como instrumento de valorização para aqueles que
a usam, conforme usam: "[...] nós somos a língua que falamos".
Já
para Santos (2000, p. 111), se a sociedade está bem ou mal os reflexos
de um ou de outro estado se reportam para a linguagem e por ela são
expressos. Assim entendido, a realidade social é a da linguagem e
vice-versa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário